Manifesto Nacional contra o PL da Dosimetria acontece em Aracaju, na Orla de Atalaia

Protestos ocorreram simultaneamente em pelo menos 20 capitais brasileiras, incluindo o Distrito Federal

Por Luiza Ferreira* 15/12/2025 13h14
Manifesto Nacional contra o PL da Dosimetria acontece em Aracaju, na Orla de Atalaia
Foto: Luiza Ferreira

Na tarde do último domingo (14), às 16h, lideranças de movimentos sindicais, parlamentares e a população em geral, reuniram-se na Praia da Cinelândia, em Aracaju, para exigir a não aprovação do PL da Dosimetria. Os Protestos ocorreram simultaneamente em pelo menos 20 capitais brasileiras, incluindo o Distrito Federal.

O Projeto de Lei número 2.162, protocolado em 2023, pelo Deputado Federal Marcelo Crivella, prevê uma mudança no cálculo das penas dos condenados pelo ato no dia 8 de Janeiro de 2023.

O texto do projeto coloca que há uma concessão de tratamento mais benéfico aos participantes que não tiveram poder de mando, nem participaram do financiamento dos atos antidemocráticos do 8 de janeiro de 2023.

O PL da Dosimetria foi aprovado na madrugada da última quarta-feira (10), na Câmara dos Deputados, com 291 votos a favor e 148 contra. Agora, o projeto de lei segue para o Senado, onde terá o Senador Esperidião Amin (PP-SC) como relator.

O Portal A8SE mergulhou na multidão para entender a arquitetura do medo que move o protesto, as implicações jurídicas e o risco de um retrocesso democrático no Brasil.

O medo do retrocesso

No Direito Penal, a “dosimetria da pena” é o processo técnico-jurídico que o juiz utiliza para fixar a pena a ser aplicada ao réu condenado. Não basta apenas dizer que determinada pessoa cometeu um crime — é preciso, também, definir com base em critérios legais e objetivos qual será a punição exata.

A dosimetria busca garantir justiça individualizada, considerando aspectos pessoais do réu, as circunstâncias do crime e as previsões da lei penal. Esse procedimento é regulamentado pelo Código Penal Brasileiro e segue um método conhecido como sistema trifásico de aplicação da pena.

Para as lideranças sindicais, o PL da Dosimetria representa um atalho perigoso. A ausência da dosimetria penal para crimes políticos, embora prevista na história, é vista, no contexto atual da sociedade, como um "cheque em branco" para quem atacou as instituições democráticas de direito.

O Presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Roberto Silva, esclarece sobre quais são os frutos estimados com a realização do protesto:" O recado a ser dado é que não se tem aceitação dessa estratégia de causar um caos na democracia e estimular mais golpes de estado. E caso o Congresso não entenda esse movimento, vamos continuar a ir às ruas, ocupar todos os espaços, inclusive a mídia, com a força da população."

O risco jurídico: a ameaça à ordem constitucional

O termo “Anistia” é utilizado na linguagem jurídica para significar o perdão concedido aos culpados por delitos coletivos, especialmente de caráter político, para que cessem as sanções penais contra eles e se ponha em perpétuo silêncio o acontecimento apontado como criminoso (art. 107, II, Código Penal).

A indignação da rua é endossada por especialistas. O projeto de lei é criticado por juristas por supostamente tentar intervir diretamente no trabalho do Judiciário e enfraquecer a separação dos Poderes.

A Advogada e Mestranda em Direito, Stefany Caroline Santos, decifra o texto da proposta: "Na realidade, a PL da Dosimetria demonstra uma negociação do Congresso para beneficiar pessoas específicas. Esse projeto de lei age de forma parecida com o que aconteceu na PEC da Blindagem. Na PEC da Blindagem, o Congresso estava agindo a fim de promover o não cumprimento ou o cumprimento reduzido de penas destinadas a parlamentares. E neste caso, o projeto refere-se às penas aplicadas pelos ataques de 8 de janeiro de 2023.”

Ela ressalta que o impacto na jurisprudência seria devastador, podendo ser usado no futuro para justificar atos ainda mais violentos contra as instituições: “É uma proposta completamente arbitrária, para dizer o mínimo. E que, no fim das contas, em última análise, atenta também contra a democracia. Porque dá para essas pessoas que cometeram atos violentos contra o Estado Democrático de Direito, uma justificação.”

O grito da responsabilização: a voz da rua

A maioria dos manifestantes na Cinelândia não estavam ali para defender partidos, mas para defender um princípio: a lei deve ser aplicada a todos, independentemente do poder político ou financeiro.

"É fundamental que a gente responsabilize quem agrediu a nossa democracia. Isso não é sede de vingança; é apenas a garantia de que o nosso sistema vai se manter em pé. Se a Justiça for "mole", ela avisa: Tentar um golpe não é tão arriscado assim! Isso faz com que as pessoas pensem que o crime acaba compensando. Pior ainda, a gente perde totalmente a fé na Justiça, e ficamos na dúvida se as instituições realmente servem para nos proteger", afirma a Assistente Administrativa, Lidian Batista de Oliveira, presente no ato.

O contraponto: a defesa do PL no Congresso

Segundo o relator da proposta, o Deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), o Brasil não pode ficar prisioneiro da polarização no atual contexto de crises institucionais ao qual se encontra. Segundo ele, o projeto não é um gesto de esquecimento aos atos do 8 de janeiro de 2023, mas de reconciliação.

O Deputado alega ainda que o projeto de lei foi construído com o apoio de juristas para evitar que criminosos comuns sejam beneficiados. O Portal A8SE buscou contato com dois vereadores sergipanos que manifestaram-se publicamente a favor da PEC da Blindagem e do PL da Dosimetria, na tentativa de obter a defesa dos seus pontos de vista para a reportagem. Contudo, ambos os vereadores negaram-se a conceder entrevista.

O futuro se decide no plenário

Ao cair da noite, as luzes da Orla de Atalaia iluminavam a multidão, que, embora heterogênea, compartilhava uma única exigência: Responsabilização. O sentimento de que a política está acima da lei é o motor que transforma a insatisfação em mobilização de massa.

O manifesto "Sem Anistia para Golpistas", documentou a indignação de quem teme que o retrocesso se materialize em lei. O grito das ruas ressoa agora dentro do Senado Federal, onde os senadores da república terão que decidir se honrarão a demanda.

*estagiária sob a supervisão da jornalista Victória Valverde

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