Economia e Inovação

Por: Sudanês B. Pereira

Economista, com formação na Universidade Federal de Sergipe (UFS), Mestre em Geografia (desenvolvimento regional) e Especialista em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC). Experiências no setor governamental (municipal e estadual), setor privado (Associação Comercial Empresarial de Sergipe - ACESE e Federação do Comércio de Bens e Serviços e Turismo - Fecomércio), foi professora substituta no Departamento de Economia na UFS, pesquisadora e uma das fundadoras do Núcleo de Propriedade Intelectual, hoje Cintec-UFS.

Europa: Atração de Investimento para Infraestruturas de Pesquisa

12/10/2022
Em julho, a Comissão Europeia (CE) divulgou um relatório com os resultados de uma mesa redonda que tinha como objetivo discutir a necessidade de novas infraestruturas de pesquisas (New research infrastructures (RIs)) na Europa. Para os europeus, é extremamente importante manter e impulsionar a sua liderança em ciência e tecnologia nas próximas décadas. Mas como as novas RIs podem atrair investimentos adequados? Como avaliar melhor seus impactos socioeconômicos e científicos?

O fortalecimento da sustentabilidade, acessibilidade e resiliência das RIs é uma prioridade da Agenda Política da Área de Pesquisa Europeia para 2022-24. O Conselho da União Europeia (UE) tem um grande desafio que é o de pensar como aumentar os investimentos para estabelecer e manter grandes RIs, como síncrotrons, telescópios e instalações a laser, além de medir seus impactos socioeconômicos e científicos, para garantir e manter o financiamento. Mias ainda, os seus impactos socioeconômicos e científicos devem ser documentados e divulgados.

A Comissão Europeia define infraestruturas de pesquisa (RIs) como instalações que fornecem recursos e serviços para as comunidades realizarem pesquisas e promoverem a inovação. Eles também podem ser usados para educação ou serviços públicos, e podem ser de natureza únicos, distribuídos ou virtuais, incluindo:

1.Grandes equipamentos científicos ou conjuntos de instrumentos

2.Coleções, arquivos ou dados científicos

3.Sistemas de computação e redes de comunicação

4.Qualquer outra infraestrutura de pesquisa e inovação de natureza única que esteja aberta a usuários externos.

Para os agentes de políticas públicas, as RIs são locais de aprendizado e descoberta contínuos. Segundo o entendimento dos formuladores de políticas públicas e pesquisadores, as infraestruturas de pesquisa precisam ajudar o desenvolvimento social e a excelência científica da Europa.

As RIs são uma alta prioridade da Agenda Política de Pesquisa Europeia para 2022-24, definida pelo Conselho Europeu. Em seu roteiro de dezembro de 2021, o European Strategy Forum on Research Infrastructures (ESFRI) propôs 11 novas RIs a um custo de € 4 bilhões. A maior parte desta proposta de 4 mil bilhões de euros, baseia-se em compromissos de investimento de capital dos Estados-Membros da UE.

Ao todo, a estratégia possui 22 projetos ESFRI e 41 marcos ESFRI. Cada RI é identificada por sigla, nome completo, tipo de RI, situação jurídica, ano de entrada no Roteiro, ano previsto de início de operação e custos estimados. Ver a figura 1 com alguns desses projetos.

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Fig.1. European Strategy Forum on Research Infrastructures (ESFRI)

O orçamento alocado para manter as RIs existentes no primeiro pilar do Horizonte Europa, o principal programa de financiamento da UE para pesquisa e inovação, é de € 2,4 bilhões entre 2021 e 2027.

As discussões da mesa redonda deram origem às seguintes conclusões e recomendações:

Manutenção de excelência e competitividade

Para manter a excelência científica e a competitividade, o financiamento sustentável para as infraestruturas de pesquisa (RIs) existentes e novas deve ser garantido.

A Europa está atrasada em relação aos Estados Unidos e à China em RIs, por isso precisa manter e aprimorar as RIs existentes e criar novas. Da mesma forma, o financiamento público deve ser justificado e o valor global demonstrado.

Há o reconhecimento de que tudo isso é um desafio para a comunidade de pesquisa defender investimentos grandes e de longo prazo em RIs, especialmente devido ao impacto econômico da pandemia e da guerra na Ucrânia, porque as RIs são muitas vezes capital intensivo e precisam de manutenção contínua.

Avaliação de impacto das infraestruturas de pesquisa

As avaliações de impacto, abrangendo fatores socioeconômicos e científicos e, cada vez mais, a ‘pegada de carbono’, são fundamentais para garantir e manter o financiamento. Muitos estudos de avaliação de impacto, experimentando diferentes metodologias, estão em andamento. O próximo passo será cruzar essas avaliações e então identificar e alinhar o que é bom. À medida que essas metodologias são harmonizadas e as melhores práticas compartilhadas em toda a UE, os estados membros poderão comparar melhor os retornos do investimento em RIs e determinar quais RIs merecem financiamento adicional ou novo. Além disso, existe o entendimento de que as RIs existentes devem ser avaliadas para potencial aumento de recursos, e para determinar se novas RIs são realmente necessárias ou não.

Segundo os agentes públicos, pesquisadores e setor privado, a avaliação do impacto científico de uma RI é muito importante, pois esse processo muitas vezes permitirá a avaliação dos impactos econômicos e sociais. O impacto científico deve ser analisado com avaliações quantitativas e qualitativas para apoiar a tomada de decisões com base em evidências, evitando distorções e usos indevidos. As práticas de coleta de dados existentes tendem a subrepresentar a contribuição dos RIs para a ciência e, portanto, novas abordagens que explorem os avanços tecnológicos e o aumento do conteúdo são bem-vindas.

Quando uma avaliação de impacto ainda não está completa ou possível devido à natureza da IR, a comercialização de uma nova tecnologia resultante da IR deve ser elaborada com uma boa narrativa, idealmente sustentada por dados capturados por novas tecnologias. Considero esse ponto muito interessante, dado que nas infraestruturas de pesquisas encontram-se as mais inovadores pesquisas, sendo, portanto, parte integrante de uma avaliação de impacto da infraestrutura de pesquisa.

O papel do setor privado

O setor privado tem um papel a desempenhar no compartilhamento dos custos das IRs com as entidades públicas. As empresas podem alugar ou pagar pelo acesso a RIs. Os Bancos e outras entidades corporativas podem ajudar a alavancar o financiamento disponível. O relatório cita, contudo, que não parece razoável esperar que o setor privado contribua significativamente para os custos de capital e de funcionamento.

O apoio e o papel dos pesquisadores

Segundo o relatório, a importância científica de uma IR deve ser demonstrada em todas as fases de desenvolvimento, juntamente com o apoio de pesquisadores/comunidade científica. Da mesma forma, quaisquer decisões sobre RIs devem ser tomadas em todos os ministérios em nível nacional, idealmente envolvendo acadêmicos e interessados do setor.

As RIs financiadas pela UE devem ser acessíveis a todos os pesquisadores da UE, da academia à indústria, para serem equitativas e maximizar as contribuições das RIs para a pesquisa e a melhoria da sociedade.

Os impactos socioeconômicos e científicos das IRs devem ser divulgados. Os cientistas devem ser obrigados a relatar seu trabalho com as RIs envolvidas em periódicos revisados por pares, com acesso aberto ao público. Evidências e narrativas do mundo real sobre os benefícios sociais das RIs devem complementar as publicações.

As IRs devem ser consideradas de forma sistemática, cruzando as disciplinas da ciência para encontrar processos que possam auxiliar diversas áreas científicas, a fim de maximizar o uso das IRs. Os vínculos também devem ser forjados entre diferentes indústrias e entre universidades e incubadoras para recursos humanos, desenvolvimento de tecnologia, exploração da RI e geração de ideias.

Como são necessárias pessoas para criar RIs, as universidades devem apoiar essa necessidade em seus currículos. Fomentar carreiras em RIs levará ao sucesso futuro em pesquisa.

Comentários finais

Pesquisa, ciência, tecnologia e inovação. Essas são as linhas mestras básicas para dar competitividade a um país ou mesmo a um território específico (regiões ou cidades). Prover infraestrutura básica para que essa cadeia permita alavancar o desenvolvimento econômico e social é fundamental.

Para isso, é necessário ter um planejamento estratégico do que se deseja: quais pesquisas são estratégicas, qual a infraestrutura necessária e adequada, qual o custo, quais as fontes de recursos (público e privado), quais parcerias estratégicas, onde se quer chegar. As perguntas cabem para o país ou território específico (estado, cidade). Com base nisso, atrair capital privado pode ser uma estratégia inteligente.

O exemplo da Europa é uma inspiração e um Benchmarking. Vivenciamos atualmente no Brasil, um período crítico onde a educação, a ciência e a tecnologia não são prioridades. Esse é o momento de fazer escolhas, pensar estrategicamente o país, as regiões, os diversos territórios, e colocar na agenda um tema tão caro para a nossa competitividade e futuro.

Ver:

https://roadmap2021.esfri.eu/media/1250/rm21-part-1.pdf

https://roadmap2021.esfri.eu

https://www.esfri.eu/esfri-roadmap

Excelente semana!