Economia e Inovação

Por: Sudanês B. Pereira

Economista, com formação na Universidade Federal de Sergipe (UFS), Mestre em Geografia (desenvolvimento regional) e Especialista em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC). Experiências no setor governamental (municipal e estadual), setor privado (Associação Comercial Empresarial de Sergipe - ACESE e Federação do Comércio de Bens e Serviços e Turismo - Fecomércio), foi professora substituta no Departamento de Economia na UFS, pesquisadora e uma das fundadoras do Núcleo de Propriedade Intelectual, hoje Cintec-UFS.

De Onde vem os Unicórnios?

29/09/2023
Freepik

A Endeavor Insight, a divisão de pesquisa da Endeavor, fornece análises baseadas em dados que mostram o que faz os ecossistemas empreendedores prosperarem. O estudo “Where do Unicorns Come From? Studying the Career Journeysof the Top $1+ Billion Founders”, mapeia a jornada da carreira das pessoas que fundaram 200 unicórnios, 100 deles nos Estados Unidos, e 100 em mercados emergentes, como o Brasil. A ideia da pesquisa tinha como foco compreender os fatores de sucesso empresarial e as diferenças entre esses grupos.

Um unicórnio é uma empresa privada com avaliação de pelo menos US$ 1 bilhão. A Endeavor selecionou os unicórnios por ordem de maior valorização até atingir o limite de 100 fundadores em cada uma das duas categorias geográficas. A categoria de mercados emergentes incluía países da África, Ásia, Europa do Leste e América Latina - excluindo os mercados maduros da China, Índia, Israel, Japão, Rússia, Singapura, Coreia do Sul e Taiwan.

As informações sobre as trajetórias profissionais de fundadores foram obtidas por meio do LinkedIn, sites de empresas, entrevistas e fontes através de mídias. Esses dados abrangeram suas experiências educacionais e históricos de trabalho antes do lançamento do unicórnio. Cerca de 80 variáveis foram testadas para identificar as características e experiências que os fundadores dos EUA e dos mercados emergentes partilham, e aquelas que os diferenciam.

Sobre a pesquisa

É interessante como a Endeavor representou a trajetória dos fundadores das unicórnios - ver a imagem do gráfico 1 abaixo. Ela mostra o caminho percorrido pelos fundadores de unicórnios dos EUA e dos mercados emergentes. No gráfico de caminhos, cada linha representa o fundador de uma empresa unicórnio. Há 200 linhas no total, 100 representando os fundadores de mercados emergentes em verde-azulado e 100 representando os fundadores dos EUA, em azul.

Os nós ovais representam experiências importantes ao longo da jornada para fundar a empresa (o unicórnio). A ordem dos nós (representados de cima para baixo) não reflete necessariamente a ordem cronológica das experiências dos fundadores. A colocação dos nós (representados da esquerda para a direita) reflete somente uma apresentação limpa dos dados, mas não indica uma variável específica. Alguns nós que representam as principais descobertas são destacados em laranja.

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Gráfico 1. Caminhos do fundador - unicórnios dos EUA e dos mercados emergentes_

Vejamos os resultados da pesquisa “Where do Unicorns Come From?”

[1] Os fundadores de unicórnios são cidadãos globais. A pesquisa revelou que 55% dos principais fundadores de unicórnios dos EUA são imigrantes ou imigrantes de segunda geração, e os principais países de origem destes empreendedores são a Índia, Israel, China, Ucrânia, Canadá e Rússia.

A migração empresarial é um fenômeno comum nos mercados emergentes. Trinta e dois por cento dos principais fundadores de unicórnios nos mercados emergentes são imigrantes ou imigrantes de segunda geração. Muitos destes são exemplos de migração Sul-Sul, como um fundador que se desloca entre países da América Latina. Os fundadores também desenvolvem uma perspectiva global estudando ou trabalhando no exterior. Cerca de 60% dos fundadores da pesquisa estudaram ou trabalharam no exterior, acumulando redes de contatos e conhecimentos.

[2] Apenas um terço dos principais fundadores de unicórnios concluíram o bacharelado em uma universidade de elite (primeira linha). Segundo a Endeavor, as instituições de elite não são tão comuns entre os fundadores de unicórnios. Noventa e sete por cento dos 200 principais fundadores pesquisados obtiveram um diploma universitário, mas apenas um terço deles recebeu um diploma de bacharel de uma universidade de primeira linha. Considerando os programas de mestrado e doutorado, pouco menos da metade dos fundadores concluíram os estudos.

[3] A pesquisa revelou que apenas 20% dos fundadores de unicórnios trabalharam para um “empregador de elite”. A experiência de trabalho em empresas de elite, incluindo empresas de consultoria (McKinsey & Company, Bain & Company ou Boston Consulting Grupo), empresas de tecnologia (Microsoft, Alphabet (Google), Meta (Facebook), Amazon, or Apple) e bancos de investimento de grande porte (JP Morgan, Bank of America (incluindo Merrill Lynch), Citigroup (incluindo Citibank), Goldman Sachs, Barclays, Morgan Stanley, UBS (incluindo Credit Suisse) ou Deutsche Bank), era rara entre o grupo de empreendedores de unicórnios.

[4] Metade dos fundadores trabalhou anteriormente em uma startup ou uma scale up. Segundo a pesquisa, a maioria dos fundadores de unicórnios de sucesso do mundo, não tinha experiência de trabalho com empregadores de grandes marcas. Mas foi possível detectar que parte desses fundadores trabalharam para uma empresa empreendedora antes de lançar sua empresa unicórnio.

[5] A pesquisa também descobriu que cerca de metade dos fundadores são empreendedores em série. Isso quer dizer que, fundar uma empresa anteriormente pode ser um bom indicativo para os possíveis aspirantes a unicórnios. O estudo revelou que cerca de 49% iniciaram um negócio antes de lançar a sua empresa unicórnio.

[6] Um fato interessante da pesquisa foi mostrar que o fundador médio tinha 10 anos de experiência profissional. Ou seja, não existem atalhos no caminho para construir uma empresa unicórnio. Os fundadores dos unicórnios identificados na pesquisa ganharam, em média, uma década de experiência após a graduação. Portanto, não é jovem, nem abandonou a faculdade. Além disso, essas pessoas não ocupavam um cargo de tempo integral antes de fundar a empresa unicórnio.

[7] A pesquisa revelou que o estudo em ciências e engenharia é mais comum do que em negócios. Cerca de 61% dos fundadores se formaram em ciências ou engenharia na graduação, em comparação com apenas 19% que se formaram em administração. Ciência da computação, engenharia elétrica e matemática eram especialidades populares entre aqueles com formação em ciências ou engenharia. Os diplomas de pós-graduação em ciências e engenharia ultrapassaram os MBAs entre aqueles que continuaram a estudar e, para os 10% dos fundadores que concluíram o doutorado, a maioria escolheu ciência da computação.

[8] Ainda segundo o estudo, os fundadores dos mercados emergentes têm conjuntos de competências diferentes dos seus pares norte-americanos (como o trabalho anterior em finanças, consultoria, desenvolvimento de negócios ou marketing), e alcançam o estatuto de unicórnio mais rapidamente: média de cinco anos e meio, contra mais de seis anos dos norte-americanos.

Outros aspectos relevantes da pesquisa

Os unicórnios dos mercados emergentes resolvem com mais frequência problemas reais em grande escala, em comparação com os unicórnios dos EUA que tendem a seguir os modismos do capital de risco. Havia altas concentrações de fintech, comércio eletrônico e empresas de logística/transporte entre os unicórnios dos mercados emergentes.

Por outro lado, os fundadores de unicórnios dos EUA tendem a operar empresas em vários setores de alta tecnologia, incluindo aqueles decorrentes de modismos recentes impulsionados por venture capital (VC), como blockchain e criptomoeda.

Os unicórnios dos mercados emergentes tendem a criar um impacto mais generalizado, melhorando a vida quotidiana de milhões de pessoas em áreas como a inclusão financeira, o compartilhamento de viagens e em soluções com os super apps. O estudo cita como exemplo as empresas Clip, Careem e Rappi.

Por fim...

Essa pesquisa é interessante em vários aspectos. O mais relevante, não obstante outros aspectos, foi mostrar que não existe um caminho brilhante na vida dessas pessoas que fundaram unicórnios. Revelou que existem muitos caminhos para o sucesso, e os fundadores de sucesso geralmente ganham experiência empreendedora e constroem redes ao longo do tempo.

Importante também foi descobrir as diferenças claras entre os fundadores de mercados emergentes e os fundadores de ecossistemas empresariais mais maduros, como os Estados Unidos. Penso que, do ponto de vista particular, os empreendedores emergentes estão mais próximos da realidade de mercado local e respondem às demandas mais reais que, de alguma forma, podem modificar a dinâmica social e econômica dos territórios onde estão presentes.

As unicórnios brasileiras citadas na pesquisa estão na tabela abaixo, listadas em ordem decrescente por avaliação, em dezembro de 2022.

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Tab. 1. Empresas Unicórnios do Brasil e seus Fundadores

Até mais!