Economia e Inovação

Por: Sudanês B. Pereira

Economista, com formação na Universidade Federal de Sergipe (UFS), Mestre em Geografia (desenvolvimento regional) e Especialista em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC). Experiências no setor governamental (municipal e estadual), setor privado (Associação Comercial Empresarial de Sergipe - ACESE e Federação do Comércio de Bens e Serviços e Turismo - Fecomércio), foi professora substituta no Departamento de Economia na UFS, pesquisadora e uma das fundadoras do Núcleo de Propriedade Intelectual, hoje Cintec-UFS.

As Tecnologias Emergentes que dão forma à Economia

23/11/2021

A Dell Technologies e o Instituto para o Futuro (IFTF), grupo independente de pesquisa de futuros, disponibilizaram uma pesquisa na qual explora como as tecnologias emergentes irão remodelar a economia na próxima década.

O instituto vem fazendo essa pesquisa desde 2017, quando compilou opiniões com especialistas de todo o mundo para prever o que eles chamam de "próxima era de parcerias homem-máquina".

A pesquisa “Future of the Economy - Industry & Commerce in the Next Era of Human-Machine Partnerships” (2019), considera as possíveis dinâmicas tecnológicas que poderão transformar a economia até 2030.

Independente dessas dinâmicas, o fato é que estamos envolvidos com “diversas perspectivas” de novas tecnologias, falo diversas porque algumas delas ainda estarão presentes em nossa vida, outras já possuímos, e algumas estão em fase de testes ou protótipos.

Sendo bem pragmática, as novas tecnologias decididamente tornaram os negócios dissociados do local. Tudo, ou quase tudo, desde capacitação de vendas, marketing de conteúdo e relacionamento com o cliente, pode ser feito remotamente, por meio de aplicativos e serviços. Tudo isso está acontecendo nos dias de hoje. O que a pesquisa questiona é: o que a próxima década nos reserva?

O relatório explora o impacto das tecnologias emergentes de hoje - incluindo Blockchain, inteligência artificial (IA), 5G, Internet das coisas (IoT) e criptomoedas - nas organizações e na economia em geral. Muitas dessas “forças tecnológicas”, digamos assim, já estão moldando a economia e transformando a maneira como comunicamos e trocamos informações. Como elas vão interferir de forma mais profunda na economia até 2030?.

As Tecnologias Emergentes que dão forma à Economia

Segundo o relatório, a economia em 2030 será construída sobre inovações tecnológicas emergentes dos laboratórios, startups e empresas de tecnologia atuais. As tecnologias emergentes irão amadurecer e se espraiar na próxima década. Por si só, cada tecnologia emergente tem o potencial de provocar grandes mudanças. Em combinação, essas tecnologias permitirão mudanças em grande escala na economia. De fato, são inúmeras as possibilidades de aplicação das novas e emergentes tecnologias. Eis os principais pontos.

5G para 6G

Em 2030, o 5G será comum e os padrões 6G surgirão. A adoção generalizada de tecnologias 5G fornecerá uma rede eficaz de baixa latência e baixo consumo de energia para autenticar usuários, executar verificações de crédito e detectar fraudes continuamente, em segundo plano.

O 5G trará uma nova conectividade, sem fio e hiper-rápida, eliminando virtualmente qualquer atraso na velocidade da rede. Isso nos permitirá elevar o poder de computação, e será a espinha dorsal para os dispositivos IoT, criando inteligência em tempo real e impulsionando a economia.

De maneira prática, a pesquisa ilustra alguns exemplos como micro-hubs que permitirão dar mais conectividade às cidades, abrindo definitivamente o caminho para cidades inteligentes com infraestrutura digital, junto com uma infraestrutura industrial mais inteligente.

Inteligência Artificial

A inteligência artificial (IA) já está presente em diversas áreas e segmentos, e cada vez mais irá apoiar a economia, validando transações, fornecendo autenticação contínua e permitindo que algoritmos autônomos tomem decisões ágeis.

A IA permitirá que sistemas inteligentes monitorem todo o ciclo de vida de uma cadeia de suprimentos, considerando velocidade, desperdício e um melhor atendimento à demanda. Os modelos de previsão determinarão rapidamente um possível comportamento fraudulento e criarão recomendações personalizadas para os clientes.

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Essa é uma das tecnologias que é difícil prever o seu alcance, tamanha é a sua dinâmica e diversidade de potencial. Para mim, o mais importante é que ela não é criativa como os humanos, ela é imitadora, embora tenha um aprendizado extremamente rápido.

Internet das Coisas e Sensores

Segundo os diversos artigos e a própria pesquisa da Dell, os dispositivos IoT permitem capturar detalhes de rastreamento refinados, revelando dados adicionais que normalmente perderíamos ou seríamos incapazes de considerar. Por meio desses dados, pode-se ‘antecipar’ os desejos e necessidades dos clientes, criar autenticações mais sólidas, revisar processos para melhorar a eficiência dos negócios.

Algo que soa estranho, mas que já está sendo inclusive utilizados de forma bem sucinta por algumas empresas, são os sensores via IoT. Segundo a pesquisa, na próxima geração da IoT, e até 2030 tanto as máquinas quanto os trabalhadores serão supervisionados por dispositivos IoT que coletam e relatam dados para sistemas humanos e, cada vez mais, com inteligência artificial. Trabalhadores da gig economia de serviços como Uber e Lyft são os primeiros exemplos disso: os algoritmos para esses serviços funcionam como gerentes e direcionam os motoristas para seu próximo destino.

Outro exemplo interessante colocado pela pesquisa diz respeito à agricultura. Hoje a agricultura consome 70% de água doce e também responsável por 70% da contaminação de água doce. Alimentar uma população global cada vez maior e ao mesmo tempo conservar os recursos naturais, será um dos maiores desafios da sociedade nos próximos anos e décadas. Algumas empresas já estão procurando enfrentar esses desafios combinando sensores sofisticados e dispositivos de IoT para reinventar a agricultura. Como? por meio de diversos conjuntos de dados, gerados por sensores conectados com solução de Internet das coisas (IoT), tecnologias avançadas de análise de dados, e usando inteligência artificial, que permite criar um ambiente seguro, que proporciona um rendimento máximo, nutrientes equilibrados e alimentos saudáveis; em fazendas verticais, sem uso de agrotóxicos, usando até 95% menos água.

Blockchain

De acordo com Filho (2017)[1], a tecnologia Blockchain pode ser entendida de várias formas. Em linhas gerais, pode-se dizer que se trata de um sistema distribuído de base de dados, mantido e gerido de forma compartilhada e descentralizada (através de uma rede peer-to-peer, P2P), na qual todos os participantes são responsáveis por armazenar e manter a base de dados.

Já para Gupta (2017)[2] o Blockchain é como “um livro-registro compartilhado e distribuído que facilita o processo de gravação e rastreamento de bens em uma rede de negócios”. O blockchain opera de forma par-a-par ou peer-to-peer (P2P) em uma rede compartilhada, onde todos os usuários podem acessar os registros para conferência e podem adicionar novos blocos de informações.

Ou seja, o próprio nome do sistema serve como esclarecimento de como ele funciona. “Block” ou blocos e “Chain” corrente, nos entrega a ideia. Tudo é uma grande corrente de blocos de dados que necessitam de seus anteriores para serem válidos.

O que o relatório da Dell diz sobre essa tecnologia? que em 2030 os casos de uso para blockchain serão extremamente abundantes. Uma das tendências apontadas refere-se aos contratos inteligentes. Os contratos inteligentes ajudam as pessoas a trocar qualquer coisa de valor de forma transparente e ‘sem conflitos’, evitando os serviços de um intermediário. As partes definem as regras e penalidades em torno de um acordo, e impõem a obrigação - o que significa que determinam se um ativo é trocado ou reembolsado.

Segundo a pesquisa, o blockchain permitirá a transição de uma economia de assimetria de informação, onde a informação é retida ou simplesmente não compartilhada com partes conhecidas, para a acessibilidade universal, ou para uma relação mais simétrica com o comércio e a economia.

Criptomoedas

A criptografia e o blockchain estão intimamente ligados. Ela é uma área de estudo que visa proteger dados de ataques ou roubos de terceiros. A tecnologia que envolve as criptomoedas e suas transações, assim como o blockchain, utiliza a criptografia, garantindo a segurança de que ninguém possa intervir de forma maliciosa em nenhum momento do processo.

O relatório afirma que o uso de blockchain para criar criptomoedas criou moedas alternativas que são globais, são menos propensas a fraudes, liquidam imediatamente, neutralizam o roubo de identidade e permitem o pagamento pessoa a pessoa sem intermediários.

Cerca de 47% dos líderes de negócios entrevistados pela Dell Technologies esperam realizar mais transações por meio de blockchain nos próximos cinco anos, enquanto 37% prevêem o uso de criptomoedas como forma de troca.

De acordo com o estudo, ao longo da próxima década, novas criptomoedas surgirão, algumas indexadas em valor a uma moeda fiduciária. Essas moedas, conhecidas como stablecoins, podem permitir que as criptomoedas ultrapassem os veículos de investimento especulativos.

Rumo a uma Economia Sem Fricção (Friction-Free Economy)

A pesquisa da IFTF e da Dell Technologies sobre a próxima era de parcerias homem-máquina explorou como a relação humana com as tecnologias exponenciais moldará ainda mais nossa economia e negócios até 2030.

Os avanços no aprendizado de máquina estão dando ferramentas analíticas cada vez mais sofisticadas para entender como as decisões individuais afetam sistemas inteiros. As tecnologias de blockchain estão desintermediando transações financeiras e permitindo que pessoas, empresas e máquinas realizem transações diretamente. A Internet das coisas vai permitir se conectar diretamente com os usuários e permitindo que as empresas atendam seus consumidores de maneiras cada vez mais personalizadas.

Cada tecnologia que discutimos ao longo do artigo, aponta para novas maneiras de criar valor. Em conjunto, essa combinação de tecnologias moldará oportunidades em grande escala para contornar ineficiências e inaugurar novas maneiras de conduzir os negócios e trocar valor. As macro implicações serão transformadoras.

De acordo com o relatório, ainda há muitos obstáculos a serem superados para alcançar uma economia sem atrito/fricção até 2030. Alguns insights são apresentados no estudo.

  1. As tecnologias emergentes têm a capacidade de impulsionar o progresso humano, mas também podem trazer consequências se não regulamentadas. Por exemplo, a inteligência artificial tem o potencial de transformar a indústria. Mas a tecnologia também pode ser usada para explorar brechas de segurança em bilhões de dispositivos conectados.
  2. Os dispositivos IoT apresentam um certo grau de risco. Esse risco é particularmente sério na área da saúde. Como os dispositivos médicos conectados são integrados ao corpo, aumenta a oportunidade de colocar a vida dos pacientes em risco.
  3. Em relação às maiores preocupações com segurança, uma economia sem atrito exigirá uma nova abordagem à privacidade de dados que maximize os benefícios para os usuários enquanto minimiza a sensação - real ou imaginária - da invasão de novas tecnologias.
  4. 4.600 líderes de negócios em todo o mundo classificam as preocupações com segurança e privacidade de dados como a barreira mais urgente para uma transformação digital bem-sucedida. Setenta e quatro por cento das respostas rotularam a privacidade como uma preocupação urgente da sociedade, seguida pela segurança (73%).
  5. Da mesma forma, a economia emergente sem atrito criará novos tipos de dilemas sobre a interação com máquinas inteligentes à medida que desempenham papéis cada vez mais variados na economia.

Para os especialistas, a maior dúvida sobre uma economia sem atrito, é em torno do futuro do trabalho. Com o surgimento da IA, muitos especulam que o aumento da automação de tarefas pode levar à perda de empregos. As previsões anteriores indicaram que, embora alguma perda de empregos possa ocorrer em campos específicos, como manufatura, as tecnologias emergentes também criarão oportunidades. Novos empregos, que não existem hoje, começarão a surgir.

Mais uma vez, eu chamo a atenção para a educação contínua e a aprendizagem ao longo da vida, que serão essenciais para que os trabalhadores participem nas economias futuras. Além dos programas de requalificação, os trabalhadores podem ser empreendedores e iniciar seus próprios negócios. Os especialistas acreditam que haverá oportunidades nas artes, criando novos empreendimentos, melhorando a vida das pessoas.

O relatório conclui que os avanços técnicos na próxima década abrirão oportunidades para reduzir e até eliminar alguns dos atritos existentes na economia.

O estabelecimento das bases de uma economia sem atrito dependerá de uma combinação de conhecimento técnico, liderança inovadora e um senso de visão e determinação, para encorajar um ecossistema de inovação. Os líderes que se engajam com essas possibilidades hoje, podem estar remodelando a economia de 2030 para um bem maior.

Excelente semana!

[1] FILHO, José Reynaldo Formigoni; BRAGA, Alexandre Mello; LEAL, Rodrigo Lima Verde. Tecnologia Blockchain: uma visão geral. CPQD, 2017. Withe Paper.

[2] GUPTA, M. Blockchain for Dummies IBM Limited Edition. 1. ed. Hoboken: John Wiley & Sons, Inc., 2017.