Por: Sudanês B. Pereira
Economista, com formação na Universidade Federal de Sergipe (UFS), Mestre em Geografia (desenvolvimento regional) e Especialista em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC). Experiências no setor governamental (municipal e estadual), setor privado (Associação Comercial Empresarial de Sergipe - ACESE e Federação do Comércio de Bens e Serviços e Turismo - Fecomércio), foi professora substituta no Departamento de Economia na UFS, pesquisadora e uma das fundadoras do Núcleo de Propriedade Intelectual, hoje Cintec-UFS.
As Startups de Mobilidade: tendências e sustentabilidade
É fato que o mundo está passando por um momento muito difícil, diversos acontecimentos contribuíram para a convergência de vários fenômenos que estão desafiando as economias nacionais: inflação alta, taxa de juros crescentes, crescimento lento, mudança climática, stress ambiental, são apenas alguns dos fenômenos.
Um artigo do fDi Intelligence, braço do Financial Times, chamou atenção ao mencionar que as startups de mobilidade estavam em ‘rota de colisão’ enfrentando essa nova realidade econômica de crescimento lento, além das incertezas dos investidores de capital de risco (VC). Alguns exemplos foram citados: a empresa britânica de baterias Britishvolt, que ficou sem dinheiro no final de outubro; a empresa de caminhões elétricos Nikola, cujo fundador Trevor Milton foi condenado por fraude em meados de outubro por enganar investidores; start-up sem motorista Argo, apoiada pela Ford e Volkswagen, que agora está fechando; e a Silk Sports Car Company, uma joint venture (JV) sino-americana cujos planos de desenvolver um carro elétrico de luxo na Itália estão atualmente marcados pela incerteza.
Percebe-se, não somente com as informações da fDi, mas também por outros artigos, que as startups estão enfrentando problemas, em especial aquelas vinculadas às indústrias mais sofisticadas e que envolve novas tecnologias, como as baterias para veículos elétricos (EV), que exigem grande montante de capital. O caso mencionado da Britishvolt é interessante - eles precisavam montar a produção de células do zero e ficaram sem recursos em outubro, enquanto construíam uma giga fábrica de £ 3,8 bilhões e 30 gigawatts-hora (GWh) em Blyth, Inglaterra.
Um estudo da Mineral Intelligence prevê que a capacidade das gigas fábricas europeias crescerá de de 71 GWh em 2022 para 1,2 terawatt-hora em 2031. Os especialistas em automóveis e infraestrutura, acreditam que as startups de baterias para EVs serão mais impactadas pelo ambiente macroeconômico de inflação e preços de energia crescentes.
Segundo o fDi, a startup de baterias Northvolt levantou mais de € 7 bilhões em financiamento e garantiu acordos de compra, mesmo assim, não está imune ao aumento dos preços. Os preços atuais de energia são um desafio para qualquer indústria, e o uso de energia pode representar entre 40% e 50% dos custos de produção das baterias de íon-lítio.
Observem o gráfico abaixo, ele mostra a evolução das startups de mobilidade no mundo, no período de 2012-2022. Houve um processo de evolução nos negócios vinculados a esse segmento de startups, chegou ao pico em 2018, logo após acontece uma pequena redução no número de negócios, e em 2021 tem a melhor performance, com 1.824 novos negócios perfazendo um valor total de US$ 93,7 bilhões, maior pico da série histórica. No entanto, em 2022 acontece um profundo recuo, até setembro foram negociados 897 negócios com valor acumulado de US$ 32,7 bilhões.
O que aconteceu foi que muitas startups tiveram problemas de produção ao tentar escalar a fabricação, sem contar os problemas na cadeia de suprimentos com chips e outros componentes críticos.
fDiAs ações da startup Nikola, destaque entre as startups de tecnologia de mobilidade de capital aberto, caíram quase 70% desde o início do ano, o CEO da empresa foi condenado por fraude, ao enganar investidores sobre a tecnologia de hidrogênio da empresa. Outros possíveis empreendimentos de EV correm o risco de serem prejudicados por financiamento inseguro. A Silk Sports Car Company, uma JV sino-americana de € 1 bilhão entre a Silk EV e a gigante automobilística chinesa FAW para produzir carros esportivos elétricos no 'Motor Valley' em Emilia Romagna, Itália, foi marcada pela incerteza ao longo deste ano.
Percebe-se, pelos estudos e artigos de especialistas, que o ano de 2022 pode ser um ponto fora da curva, as startups de mobilidade podem ser a grande alternativa para a mudança da mobilidade nas cidades, a tendência é de crescimento desse segmento.
Nem tudo são problemas
A Europa tem inúmeras startups de mobilidade com futuros promissores. Nos últimos dois anos, com o advento da tecnologia e o impulso global para mudar para escolhas mais sustentáveis, mais verdes e mais acessíveis, o setor de transporte europeu apresentou grandes mudanças, com várias startups desenvolvendo tecnologia inovadora e/ou abrindo caminho para novos conceitos de mobilidade.
Todos os anos, a aceleradora de startup YCombinator, publica uma lista de cerca de vinte tópicos considerados mais promissores para a construção de novas startups. Um deles é o transporte e a mobilidade, enfatizando dois aspectos: o consumo de energia e o tempo de deslocamento das pessoas.
O artigo “Sustainable Transport and Mobility - Oriented Innovative Startups and Business Models” da professora Agnieszka Skala, de maio de 2022, busca conhecer os novos modelos de negócios de transporte sustentável e startups inovadoras voltadas para a mobilidade. Segundo ela, o transporte representa 57% da demanda mundial de petróleo (2019), e consumiu 29% do consumo total global de energia final.
Em termos de emissões de CO2, os transportes representaram 24% do total das emissões globais em 2019. Um cenário de emissões líquidas zero até 2050 exige que as emissões do setor de transporte caiam em até 20% até 2030. Nesse sentido, soluções de transporte e mobilidade orientadas para a sustentabilidade são de grande interesse para todos, as startups inovadoras encontram aí inúmeras oportunidades.
As expectativas dos clientes estão direcionando a demanda para serviços inteiramente novos, que são categorizados como uma tendência – “mobilidade sob demanda” (Mobilidade como Serviço, MaaS), que significa deixar de possuir um veículo para uma mobilidade baseada em serviços. No artigo, a professora Agnieszka mostra uma série de tendências em transporte verde e soluções de mobilidade, abrindo espaço para as startups. A tabela abaixo ilustra as tendências mapeadas pela professora.
Considerações
Os modelos de negócios inovadores validados por startups podem acelerar uma outra mobilidade, verde e sustentável. Tempos difíceis são desafiadores e as startups desempenham um papel essencial como facilitadoras, mesmo através da cooperação com grandes corporações.
As tendências apresentadas no artigo da professora é um indicador de como um novo segmento está sendo desenhado, mais sustentável e com inúmeras possibilidades. Cabe pensar uma nova mobilidade para o país e para as localidades, em especial nos municípios, com novas modelos de concessões, privilegiando soluções verdes e tecnológicas, melhorando assim o ambiente das cidades.
Excelente semana!